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sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Recursos da linguagem poética
Métrica, ritmo e rima são alguns dos recursos inerentes à linguagem poética Métrica, ritmo e rima são alguns dos recursos inerentes à linguagem poética. Os versos drummondianos, adornados de rara beleza, muito nos revelam acerca da arte do fazer poético, ressaltando: [...] Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível que lhe deres: Trouxeste a chave? Repara: ermas de melodia e conceito elas se refugiaram na noite, as palavras. Ainda úmidas e impregnadas de sono, rolam num rio difícil e se transformam em desprezo. A última estrofe parece traduzir o sentido único da discussão que ora nos propomos a traçar, haja vista que estamos nos referindo tão somente à linguagem poética, aquela em que o artista, lançando mão da matéria-prima que constitui seu labor, cria, reconstrói uma realidade, por meio de um trabalho especial com a própria palavra. Assim, Cassiano Ricardo já dizia que a poesia é uma ilha cercada de palavras por todos os lados, mas que, no entanto, segundo Drummond, se ermas de melodia e conceito elas se refugiam na noite, rolam num rio difícil. Esse trabalho especial com a linguagem se dá por meio de uma criteriosa seleção e combinação de sons, de ritmo, de melodia. Aspectos estes que se manifestam, sobretudo, pelo uso de alguns recursos considerados formais, dada a presença também de outros, de ordem estilística. Nesse sentido, certifiquemo-nos de alguns deles, levando em conta os principais aspectos que os norteiam: Métrica Escandir um verso significa medi-lo de acordo com o número de sílabas poéticas que apresenta. Sílabas estas em que nada se assemelham com as sílabas gramaticais, visto que na escansão o verso é considerado como um todo, como se fosse uma única palavra. Dessa forma, as sílabas são separadas de acordo com a intensidade com que são pronunciadas, sendo que a contagem se encerra sempre na última sílaba tônica. Havendo o encontro de duas vogais átonas, ocorrerá uma espécie de ditongo dentro do verso – o que permite que elas pertençam a uma única sílaba. De acordo com o número de sílabas que apresentam, os versos recebem distintas classificações, sendo elas assim materializadas: Monossílabos Dissílabos Trissílabos Tetrassílabos Pentassílabos (ou redondilha menor) Hexassílabos (heroico quebrado) Heptassílabos (redondilha maior) Octossílabos Eneassílabos Decassílabos (medida nova) Hendecassílabos Dodecassílabos (ou alexandrinos) Assim, constatemos na prática como se dá a escansão de um verso, apoiando-nos em alguns deles, por sinal bastante conhecidos: Mi/nha/ ter/ra/ tem/pal/mei/ras (Gonçalves Dias) 1 2 3 4 5 6 7 Constatamos, portanto, que este se trata de um verso heptassílabo, o qual se constitui de sete sílabas poéticas. Al/ma/ mi/nha/ gen/til /que/ te/ par/tis/te (Camões) 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Dez sílabas poéticas, logo, decassílabo. Ritmo Contextualizando-nos à época modernista, verificamos que muitas das criações ali presentes são destituídas de métrica (versos livres), bem como de rimas (verso bancos). Mas não há como negar: um poema pode perfeitamente ser constituído de tais aspectos, a depender da época em que foi construído, mas o que ele não pode deixar de ter chama-se ritmo – a grande marca desta modalidade textual. Ele, por sua vez, é determinado pela alternação uniforme de sílabas tônicas (fortes) e não tônicas (fracas), dispostas em cada verso de uma composição poética, bem como pelos recursos utilizados pelo poeta e pela forma como ele os organiza dentro de seu texto, com vistas a produzir o efeito desejado com a mensagem. Assim, podemos dizer que cada poema possui um ritmo próprio, tendo em vista as intenções a que se deseja obter com a mensagem. No intuito de atestá-las, verifiquemos as palavras de Manuel Bandeira, presentes na Canção do vento e da minha vida: O vento varria as folhas, O vento varria os frutos, O vento varria as flores… E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De frutos, de flores, de folhas. O vento varria as luzes, O vento varria as músicas, O vento varria os aromas… E a minha vida ficava Cada vez mais cheia De aromas, de estrelas, de cânticos. [...] Temos que a presença da aliteração, caracterizada pela repetição do fonema /v/, revela-nos o som decorrente do ato de varrer. Rima Considera-se que a rima em muito demarca o ritmo do poema, conferindo-lhe a musicalidade e a melodia necessárias. A rima se caracteriza pela semelhança sonora das palavras, podendo ser retratada no final ou no interior dos versos e em posições variadas. De acordo com essas posições, as rimas podem se apresentar como: Alternadas (ABAB): Lembrança de morrer (Álvares de Azevedo) Se uma lágrima as pálpebras me inunda, A Se um suspiro nos seios treme ainda, B É pela virgem que sonhei!... que nunca A Aos lábios me encostou a face linda! B Interpoladas ou cruzadas (ABBA): Soneto de fidelidade (Vinícius de Moraes) De tudo, ao meu amor serei atento A Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto B Que mesmo em face do maior encanto B Dele se encante mais meu pensamento A [...] Emparelhadas (AABB) e mistas, apresentando outros tipos de combinações Vagueio campos noturnos A Muros soturnos A Paredes de solidão B Sufocam minha canção B Ferreira Gullar